O olhar do visitante irá se surpreender com os 116 trabalhos (20 pinturas, 27 gravuras em metal, serigrafias e litografias, 54 desenhos, 17 charges com o pseudônimo de Maqui e seis estudos para outdoor), selecionados pela curadora Angélica de Moraes para esta exposição que será exibida na Fundação Iberê Camargo, de 9 de abril de 2016 a 26 de março de 2017.
“É uma investigação sobre o DNA da obra de Iberê Camargo focada no período de retorno ao Rio Grande do Sul, nos anos 1980, quando ele empreendeu uma inflexão em sua obra, com um decisivo retorno à figura humana. Mais do que fazer um recorte do acervo da Fundação Iberê Camargo, desde logo entendi tratar-se de identificar e oferecer ao público algumas chaves de leitura para a fruição da densa e caudalosa produção realizada pelo artista ao longo de mais de meio século de atividade ininterrupta”, diz a curadora e jornalista Angélica de Moraes (leia a íntegra da sua entrevista com Iberê realizada em abril de 1994 para o jornal Estado de São Paulo, quando eram preparados exposições e livros em homenagem aos 80 anos do pintor, que não chegou a completá-los).
Em Iberê Camargo: Diálogo no Tempo, pela primeira vez será exibida a série completa da suíte serigráfica Manequins, inclusive com algumas provas antes da impressão, em que fica evidente a insaciável busca de Iberê pela melhor forma de solucionar um trabalho. Também pela primeira vez a Fundação Iberê irá apresentar a série de desenhos Desastre, em que Iberê retratou carcaças de carros amontoados em um ferro-velho. “Soturnas reflexões sobre a velhice e a obsolescência patrocinada pelo consumismo”, diz Angélica.
Em uma das salas do percurso principal foi situada a documentação fotográfica (making-off) e os estudos para a primeira incursão de Iberê no grande formato dos outdoors, em que resolveu produzir uma releitura apocalíptica da criação do homem feita por Michelângelo para a Capela Sistina, exibida em 1984 nas ruas de Porto Alegre.
Junto a esse trabalho e seus esboços, será exposta uma seleção de 17 charges que o pintor realizou com o pseudônimo de Maqui (chamavam-se maquis os soldados da resistência francesa à invasão alemã da França, na Segunda Guerra Mundial). “Nessas charges, algumas publicadas na imprensa, na época, Iberê exercita a ironia mordaz, impiedosa, que dedicava aos políticos nacionais. Nada mais atual”, destaca a curadora.
“A predominância de gravuras e desenhos pretende frisar uma das características fundamentais da obra de Iberê: o pensamento gráfico, o pensamento criativo que deriva do desenho. Nele se observam os exercícios de acurada observação da figura e as infinitas conotações que o artista construía para nos aproximar dessas humanidades”.
Entre as pinturas, a tela Fantasmagorias IV, de 1987, assume o protagonismo da mostra. “As obras escolhidas derivam ou prenunciam esse trabalho. As três figuras esqueléticas da composição parecem furar com seus ossos a carnadura da tinta. Os azuis e os pretos que visitam boa parte da obra do artista nesse período dividem presença com os traços brancos que conferem dramaticidade escultórica ao conjunto. “Minha terra reclama meus ossos”, disse certa vez Iberê”, conta a curadora.
Crítica de artes visuais, jornalista cultural e curadora, a gaúcha de Pelotas radicada em São Paulo desde 1986, Angélica de Moraes, assinou inúmeras exposições no País, escreveu sobre artes visuais no Caderno 2 do jornal O Estado de São Paulo durante oito anos, foi editora da Select e hoje escreve para veículos especializados como a Cult, Arte! Brasileiros e ArtNexus. É autora ou coautora de 11 livros, o mais recente deles O Valor da Obra de Arte (Editora Metalivros, 2014). “Conheci Iberê Camargo pessoalmente quando de seu retorno a Porto Alegre, em 1982. Nessa época, eu assinava uma página semanal de artes visuais no jornal Zero Hora. Entrevistei-o por diversas vezes, desde então. Era com uma admiração crescente que passei a conhecer de perto o artista e a obra. Ali, eu não era repórter: era aluna. Estava diante do privilégio de tê-lo como cicerone de sua arte. Foram muitas as descobertas nesses momentos de formação. Como quando, fazendo uso de uma dessas luminárias de oficina mecânica de carros, que tem uma lâmpada portátil protegida por uma grade, aproximava a luz de suas telas mais densas e escuras, e anunciava: “Parece preto, não? Mas olha agora: é azul!” Mostrava o motor, as engrenagens de sua pintura”.
Segundo Angélica de Moares, essas são as chaves de leitura para a obra de Iberê:
- O primeiro ponto a ser elencado é a importância conferida pelo artista às superfícies líquidas, aos reflexos cambiantes que deformam o que espelham. Algo que logo passou de assunto a linguagem, com a tinta farta e revolta assumindo profundezas aquáticas ou assomando fragmentos de luz em matéria lodosa, mexida e remexida. Isso fica bem nítido desde a tela Jaguarí (1941).
- Há fusão entre gravura (mundo gráfico, da linha) e pintura (mundo da tinta densa e da cor). As vigorosas linhas de tinta na tela mais indicam a ação do traço do que descrevem os elementos da cena pintada.
- Uso preciso e econômico da linha. A forma se estabelece a partir dos traços essenciais da figura. O próprio Iberê admite que foi nas aulas de Guignard que aprendeu a valorizar a precisão da linha que seu mestre tinha ido buscar em Domenico Ghirlandaio e Paolo Uccello, pintores italianos do século XV. Ghirlandaio e Uccelo pintavam sobre madeira e traçavam nela, com estilete, os limites da figura. Guignard usava lápis de grafite duro, que arranha e deixa uma marca impossível de apagar do papel. Iberê também adquiriu esse traço decisivo tanto na sua vasta produção de gravura como na pintura.
SERVIÇO:
O QUÊ| QUANDO| Iberê Camargo: Diálogo no Tempo - 9 de abril de 2016 a 26 de março de 2017
ONDE | Av. Padre Cacique, 2000 – 51 32478000
ABERTURA DA EXPOSIÇÃO: 9 de abril (Sábado), 11h
HORÁRIO DE FUNCIONAMENTO| De terça a domingo (inclusive feriados), das 12h às 19h (último acesso às 18h30)
ENTRADA FRANCA| As empresas Gerdau, Itaú, Vonpar e Banco Votorantim garantem a gratuidade do ingresso
SITE | www.iberecamargo.org.br
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TRANSPORTE | As linhas regulares de lotação que vão até a Zona Sul de Porto Alegre param em frente ao prédio, assim como a linha de ônibus Serraria 179. É possível tomá-las a partir do centro da cidade ou em frente ao shopping Praia de Belas. O retorno pode ser feito a partir do Barra Shopping Sul, por onde passam diversas linhas de ônibus com destino a outros pontos da cidade.
Fonte: Neiva Mello Comunicação Empresarial