01) Contos Completos de Clarice Lispector
Bela edição reunindo todos os relatos curtos da grande escritora. Neles estão compendiados os propósitos literários da autora: seu interesse em desvendar a vida subjetiva das personagens, relegando a intriga narrativa a um plano secundário; as famosas epifanias (súbitas revelações da realidade interior ou exterior); mulheres enclausuradas em dolorosa solidão e em busca incessante da própria identidade; perpétua sensação de náusea das protagonistas, oscilantes entre o desconforto da contínua interrogação íntima e o desejo de estabelecer vínculos com o mundo objetivo. Para ler e reler com aquela atenção que Clarice exige para que penetremos em seu universo singular.
02) O Museu da Inocência - Orhan Pamuk
- Companhia das Letras
Esplêndido romance do maior ficcionista turco contemporâneo (Prêmio Nobel, 2006), autor de narrativas que sintetizam admiravelmente dramas pessoais com a conflituosa realidade de um país dividido em seus traços identitários: Ocidente X Oriente, costumes antigos e costumes modernos. Em O Museu da Inocência, o escritor cria um protagonista atormentado por louco amor que se perdeu, reconstituindo-o obsessivamente através de um triste museu de objetos. O museu funciona como uma espécie de desencadeador de lembranças e, também, como um retrato simbólico das contradições da sociedade turca. Trata-se, com certeza, de um dos melhores romances do século XXI.
03) Diário da Queda - Michel Laub - Companhia das Letras
Recentemente indicado como leitura obrigatória para o vestibular da UFRGS, este romance do jovem escritor gaúcho confirma um talento de primeira linha na atual literatura brasileira. Verdadeiro drama da memória, centrado em representantes de várias gerações de judeus (o avô, o pai e o narrador), o relato sustenta-se em três tipos de diários pessoais, tendo sempre como sombra ameaçadora as lembranças do Holocausto, o Alzheimer do pai e a consciência culpada do narrador em relação a um ato coletivo de brutalidade que cometeu, em um colégio judaico, ao lado de outros colegas, contra um gói. Um texto surpreendente por sua densidade e poder verbal.
04) 68 Contos de Raymond Carver – Companhia das Letras
Um dos contistas mais notáveis do século XX e, ao mesmo tempo, um dos mais desconhecidos, Raymond Carver (1938-1988), cuja biografia é marcada por ciclos contínuos de infelicidade, escreveu infinito número de pequenas obras-primas que tomam a vida cotidiana norte-americana como assunto. Com estilo despojado e preciso, constrói um conjunto de relatos de forte impregnação realista, quase sempre dominados pela angústia, por atmosferas opressivas e pela sensação de absurdo da existência, com personagens inadequados a uma modernidade infeliz. A linguagem seca acentua o caráter cruel e, paradoxalmente, lírico dessas geniais narrativas curtas.
05) A Ferro e Fogo - Josué Guimarães - LPM
Injustamente esquecida pelas novas gerações de leitores, a obra de Josué Guimarães insere-se na tradição rio-grandense de ficções realistas com acentuado gosto histórico, nos moldes de O Tempo e o Vento. É na trilha de Erico que Josué planejou uma trilogia sobre a colonização alemã em nosso estado, baseada nas sucessivas gerações de uma mesma família. A trilogia, no entanto, resumiu-se a duas obras: Tempo de solidão e Tempo de guerra. A primeira delas é que alcança os melhores resultados estéticos. A chegada dos imigrantes alemães, sua difícil adaptação a uma província quase bárbara, a violência cotidiana e a áspera faina do cotidiano são registradas com um vigoroso realismo imediato.
06) Teresa Batista, Cansada de Guerra - Jorge Amado
- Companhia das Letras
Desprezado até certo ponto pela crítica literária, Jorge Amado continua encantando muitos leitores com suas obras cheias de energia dos instintos, sexualidade franca e incomparável alegria de viver. Dos romances publicados na sua chamada “segunda fase”, três se destacam sobremodo: Gabriela, Cravo e Canela, Os Velhos Marinheiros e Teresa Batista, Cansada de Guerra. Todos naturalmente já passaram pelo cinema e por séries de tevê, embora a tradução visual de Teresa Batista tenha sido menos feliz, pois se trata de obra com a mesma vibrante perspectiva vitalista do escritor, mas alavancada por algumas cenas de forte dramaticidade, como a subjugação da protagonista (que depois virará prostituta) a um violento capitão sertanejo.
07) A Guerra do Mundo - Niall Ferguson - Planeta
Trazendo como subtítulo A Era de Ódio na História, este alentado livro do historiador inglês Niall Ferguson resume em quase 900 páginas – esplendidamente escritas – a violência e os massacres inqualificáveis que ocorreram no século XX, não apenas durante as guerras mundiais, mas também durantes as guerras localizadas que se sucederam no período. Mais do que uma suma da sangueira universal, Ferguson tenta compreender os variados fatores que levaram a tantos e tão atrozes conflitos. Para quem gosta de História, uma leitura fundamental.
08) Jesus e o Ocidente - José Hildebrando Dacanal - Besouro Box
Terceira edição de erudita e impactante análise do cristianismo enquanto conjunto revolucionário de ideias. Alicerçado em um conjunto de perguntas essenciais (Quem foi Jesus de Nazaré? Como surgiu a religião chamada cristianismo? Quem eram os primeiros cristãos?), o professor gaúcho – em um texto não religioso – desvela aspectos pouco lembrados do cristianismo que contribuíram para a formação da cultura e do homem ocidental. Explica, sobremodo, como tal visão de mundo, nascida entre gente humilde alçou-se a uma ideologia totalizante e alcançou tamanho domínio no transcurso dos séculos.